Revoga-se a Lei Ferrari 6729/79
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, enviou ofício à chefe
da Casa Civil, ministra Gleisi Hoffmann, pedindo a revogação da Lei 6.729/79,
conhecida como Lei Ferrari, que dispõe sobre a concessão comercial entre
produtores e distribuidores de veículos. O pedido é baseado em dez razões
citadas pela 3ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal
(Consumidor e Ordem Econômica). Para a Câmara, a manutenção da lei contribui
para um cenário de preços altos e, de modo geral, para a baixa qualidade dos
veículos no Brasil.
O coordenador da 3ª Câmara, Antonio Fonseca, explica que a regulação
federal possibilita uma série de restrições verticais, em prejuízo do processo
competitivo em diversos elos da cadeia de comercialização. Ao mesmo tempo,
autoriza a troca de informações entre concorrentes, no âmbito da produção
(montadoras) e da distribuição (concessionárias), possibilitada pelas
convenções de categorias econômicas (na produção) e pelas convenções de marca
(na comercialização).
Segundo nota técnica produzida pela 3ª Câmara, toda a concepção da Lei
Ferrari amarra e engessa a comercialização de veículos no país, em benefício
principalmente das concessionárias, e em prejuízo dos consumidores e demais
agentes da cadeia produtiva (revendedores independentes, lojas de autopeças, prestadoras
de serviços de reparo de veículos, transportadores independentes, etc). “O
interesse das montadoras e, principalmente, das concessionárias de veículos não
deveria contrapor-se aos interesses dos consumidores”, diz.
Ao participar de audiência pública no Senado Federal, em dezembro de
2012, Fonseca apontou a deformação básica gerada pela Lei Ferrari em relação ao
controle das práticas comerciais no setor automotivo. “O problema do excesso de
regras de comercialização pela Lei Ferrari é que, de todos aqueles setores
regulados que a Constituição especifica, vem sempre atrás uma estrutura, uma
autoridade reguladora. Aqui, temos o cheque em branco, uma lei que regula e não
dá uma autoridade reguladora para controle”, declarou.
A nota técnica da 3ª Câmara abordou as contribuições de documento
produzido pela Secretaria de Acompanhamento Econômico (SEAE) e examinou
informações levantadas por meio de iniciativas do Senado Federal, que buscam
explicações para os elevados preços dos automóveis no país e propõe medidas
para superar distorções existentes no mercado automotivo. Ambos indicaram a
necessidade de revisão do marco legal, mas, para a 3ª Câmara, a revogação da
lei é “a única forma de o Estado quitar com grande atraso uma dívida com o
cidadão”.
Fonseca espera agora que outros órgãos ligados à defesa do consumidor
possam apoiar o pleito do MPF.
Conheça as dez razões enumeradas para revogação da lei Ferrari
1. Influência discutível do “custo Brasil”: os efeitos da carga
tributária e dos custos de produção mais elevados não justificam plenamente os
preços mais altos no país, conforme estudo do Senado Federal.
2. Risco de cartelização: a previsão de
Convenções de Categorias Econômicas e de Convenções de Marcas permite a criação
de ambiente propício para a troca de informações e acordos, ainda que tácitos,
sobre variáveis comerciais, com o risco de restringir a concorrência.
3. Restrição à concorrência no mercado de autopeças: o “índice de
fidelidade de compra de componentes dos veículos automotores” a que as
concessionárias estão submetidas reforça o poder das montadoras no segmento de
serviços de pós-venda.
4. Restrição à concorrência interna à marca: a lei traz várias
restrições comerciais que limitam a concorrência dentro da marca, como a
proibição de venda de veículos pelas concessionárias a outras revendas e pelas
montadoras ao consumidor final, e ainda a exclusividade territorial concedida
às concessionárias.
5. Restrição à concorrência entre marcas: a possibilidade de a
montadora impedir a concessionária de comercializar outra marca restringe a
concorrência entre marcas.
6. Alta concentração entre as maiores montadoras: a concentração de
mercado entre as quatro maiores montadoras (Volkswagen, Fiat, General Motors e
Ford) diminuiu apenas de 100% para 82% entre 1995 e 2010, após a
desconcentração ocorrida no período, durante o qual entraram no mercado treze
novas marcas.
7. Baixa qualidade e atraso em recursos de segurança: pela falta de
incentivos de competitividade, a qualidade dos veículos fabricados no país é
mais baixa que nos países industrializados, e o Programa de Avaliação de Carros
Novos para a América Latina estimou que em modelos populares a segurança está
cerca de 20 anos atrasada em relação àqueles países.
8. Distinta experiência internacional: ao longo das mais de
três décadas de vigência da Lei Ferrari, o mercado automotivo passou por
transformações nos Estados Unidos e na Europa. Na maioria dos estados
americanos (encarregados da legislação no setor), é proibida a imposição de
restrições verticais semelhantes às da Lei Ferrari, como índices de fidelidade
para autopeças e exclusividade contratual de marca em estabelecimentos
varejistas. Na Europa, nova regulamentação a partir de 2002 reduziu a
incidência de exclusividade nas redes de distribuição, vedando-a a fabricantes
com mais que 30% do mercado.
9. Incompatibilidades entre a Lei Ferrari e a Lei de
Defesa da concorrência: o Cade já se debruçou várias vezes sobre
representações acerca de condutas dos agentes econômicos do setor automotivo,
reconhecendo o caráter anticompetitivo dos fatos indicados. No entanto, nesses
casos, o tribunal administrativo pouco ou nada pôde fazer, tendo em vista que
esses fatos encontravam respaldo na lei.
10. Engessamento normativo: a moldura legal
criada pela Lei Ferrari dificulta a proposição de mudanças pontuais. Todas as
iniciativas no Congresso resultaram em arquivamento, e até um projeto da
senadora Ana Amélia, que propõe alteração da lei em seus artigos mais
restritivos à concorrência, tem encontrado dificuldades no andamento.
Fontes: Gol 1.0 fabricado no Brasil custa R$ 18.000,00 no Mexico
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